quarta-feira, 9 de julho de 2014

Antes fosse - Uma História Real Baseada em Fatos Cinematográficos


PRIMEIRO ATO - PRÓLOGO

Eu morava em apartamento. Qual a chance de um ladrão invadir o meu apê? Remota. Mas quando eu ouvi o barulho da porta abrindo, ainda de olhos fechados a primeira coisa que veio em mente:um ladrão entrando aqui em casa.
Antes fosse.
Deitado na cama, abri os olhos. Minha namorada com um sorriso de saudade no rosto. Olhei para ela. Dei um sorrisinho de oi + saudade+ sexta-feira+ meu dia de folga + acordei, mas não tenho hora para levantar.
Fechei os olhos.
- Que isso?! - disse ela num tom de choque misturado com raiva, deveras surpreendente pra mim naquele momento.
Sem me mover, de olhos fechados, pensei isso tudo em uma fração de segundo:
- Que isso?! Que isso o que??!! Que tipo de pergunta é essa!!!?? Uma hora dessa ?! Será foi porque dormi com a roupa suja da rua de novo? (Antes fosse...)Que chatinha, me deixa dormir, porra! 
Péra aí... 
Não, não, pera aí... 
Tem alguma coisa errada ...
Puuutzzz! Que merda...
Tem uma mulher na cama comigo!
Ah essas coincidências cinematográficas. Coincidiu: eu ficar no Rio no fim de semana + o samba do chapeu em Santa Teresa +  uma moçoila vinda da Hungria sambando no Brasil na minha frente. Ela era conhecida de um conhecido e sim, achei ela bonita. Meu contato com ela foi trocar um par de palavras e alguns pares de olhares, e minha intuição me disse que a gringa ficou interessada em mim. Uma semana depois, confirmei quando recebi o seguinte email num inglês bem endêmico:
Oi  Franco!
Tudo bem. :)
I don`t know you remember me, but we met in Santa Teresa last Sanday.
You know I`m a Hungarian girl. And we have a common friend Joan. :)
So Joan told me you are artist and maybe you can`t help me...
Because maybe I`m also artist.
So if you have time check my photos.
I have Brazilian number, so I hope see you later. I like you. I hope be with you more. :)
Have a nice day! :)
N.
E assim começou tudo.
Tudo a mais genuína ingenuidade.
Tudo uma grande incidência de incidentes.
Tudo uma sequência de inconsequências.


A Húngara parecia muito com a Daenerys Targaryen nessa ilustração, sente o drama.



SEGUNDO ATO - UMA TRAGÉDIA ANUNCIADA


Sempre me irritou o fato de que minha namorada (que era muito linda, o apelido dela no teatro era Jolie, por causa da semelhança com a Angelina) dava trela pra todo mundo. Isso ela fazia bem: Falava com qualquer homem na rua, achava(dizia ela que achava) que todo mundo queria só ser amigão, e dava papo, e era super simpática, e dava o telefone. É amigo, isso mesmo: o telefone!
Talvez pra me provocar? Talvez. Talvez só por ser simpática? Talvez. Talvez pra massagear o ego dela? É...talvez... Mas enquanto isso, na cabeça masculina: "Beleza, tá me dando mole,vou pegar, vou comer!"
Mas e eu? Eu? Eu achei bem estranho e achei talvez um pouco mais claro o interesse da gringa, depois do email, mas...É, eu dei trela. É, eu fui super simpático, agradável... Eu dei o telefone.
É, é isso mesmo! O telefone! Cinco minutos depois ele tocou. E eu? É... pois é, eu dei mais trela.
Na semana seguinte em que dei e recebi ligações, eu oscilei entre:
Essa menina tá me dando muito mole...
Essa menina e só gente boa, não tá me dando mole...
Não! Ela tá me dando mole!
Não, nada a ver, não tá não...
Tudo a ver. Ela tava dando mole. E o que eu fiz? Aaaah eu continuei com a ingenuidade, continuemos a dar trela, não é? Talvez porque eu sou inconsequente? Talvez. Talvez pra me vingar da minha namorada? Talvez. Talvez porque eu e 98% da população mundial gostamos de ter o ego massageado? Talvez...
Mas enquanto isso, na cabeça da gringa: "Beleza, um latino exótico tá me dando mole e quer me comer!”.
E depois de muitos contatos por telefone, porque não se enganar, fingir que está tudo sob controle e marcar um contato pessoal acompanhado de cerveja?
Vai acreditar numa ingenuidade dessa...
Fomos beber na praça São Salvador e foi quando percebi o interesse claro através de toques e de olhares, realmente, estava tudo sob controle. Eu não estava afim de nada, nem de dar uns beijinhos, e a gringa ia fazer o que? Me agarrar?
Por via das dúvidas, que tal falar da minha namorada??? Mas quanta ingenuidade, garoto! Falta de interesse do macho e comprometimento com outro ser do sexo feminino são os maiores aguçadores do desejo das fêmeas! Só não se toca disso quem é garoto, garotinho juvenil como eu.
Depois de três cervejas já era Game Over pra mim, mas a gringa querendo muito jogo. Na praça, silêncios e olhares constrangedores entre eu e a gringa. Ela olhava, eu desolhava. Eu desinteressava, ela se interessava mais. Eu desaproximava, ela aproximava.
-Eu vou embora- disse eu, acreditando ingenuamente no fim daquilo tudo.
-Eu também- disse ela, acreditando na continuação daquilo tudo.
-Minha casa é logo ali vou a pé, mas antes te acompanho até o ponto- decretando o final.
-Não, pode deixar. Eu também vou a pé- decretando um novo começo...
Eis o começo de uma tragédia anunciada: Era uma vez uma húngara que queria ir a pé da praça São Salvador para casa. Só que ela morava no Albergue Flamejante Synedoque NY em Copacabana, que era em um reino muito distante. Ela foi embora a pé e ele foi para seu apartamento e ambos foram felizes para sempre. Assim foi a história.
Antes fosse.
Já era meia noite e sería bem sem noção deixar a gringa ir embora a pé sozinha. Sabendo disso, o ingênuo menino disse:
-Que isso!? Que a pé, N.!! Você tá viajando! É muito longe!- falei eu, o bom menino.
Ela insistiu, e insistiu e insistiu, e insistiu. E quando viu estava ele, no meio da Senador Vergueiro indo a pé... Pra onde?
Pra Copacabana. Pra Copacabana?!?!
-Que isso, você tá viajando! Vamos pegar meu carro, te levo em casa.
E assim seguiu o bom menino garoteando.
As músicas românticas acidentais no rádio insistiam em querer criar o clima que eu insistia em querer quebrar e que a gringa insistia em querer criar.
Chegamos! Beijo, tchau e benção! Até mais queridona...
Antes fosse...
Paro o carro, ela me olha e olha minha boca. Me olha. Olha minha boca. Ela espera não sei (mas sei) o que.
- So...that's it, right? Eu achando que tinha acabado. Ha- ha -ha
Ela não pára de me olhar. Meu Deus ela não pára. E pra não olhar pra ela olho para fora e, olha que beleza!
Uma galera, muita gente mesmo, do lado de fora na porta do albergue dela.
- Teu albergue é rock n' roll hein? Alguma festa lá hoje? -brinquei eu.
Com cara de surpresa ela olha e diz:
-No, there is something wrong happening.
Caminhamos até o albergue e vos apresento:
Albergue Synedoque NY: o único Albergue do Rio que pega fogo!
Pois é isso mesmo que você leu: o albergue dela não TINHA pegado nem IRIA pegar fogo, o albergue dela ESTAVA PEGANDO (gerúndio!) fogo na hora exata que eu ia deixar a mocinha em casa. Caminhão de bombeiros chega, sirene ensurdecedora, pandemônio, confusão e tudo da gringa dentro do local em chamas.
Como um bom garoto, criado a leite com pêra, você acha que eu vou ser insensível ao ponto de dar um "tchau a gente se fala" CARIOCA STYLE para um menina numa hora e situação dessa?
Antes fosse...



TERCEIRO ATO - EUROPEAN STYLE EPILOGUE

Se você fosse um bom menino você levaria uma europeia gostosa pra sua casa prometendo a ela: pode ficar tranquila, não quero e não vou fazer nada com você? Pois é, eu fui.
Garotinho, eu já comecei errado que com um apartamento de 3 quartos, e 4 camas, escolhi a minha cama pra alojar a rapariga e dar uma de bom anfitrião.
Continuei errado quando disse:
-Fica a vontade ae, toma aqui uma toalha, uma camisa e um short.
Fiquei ainda mais errado ao fingir naturalidade quando a gringa saiu maliciosa e sedutora do banho, só de camisa e calcinha, sem o short que eu dei.
Como se ainda fosse possível, eu consegui me afundar mais ainda quando atendi ao pedido do European Style que você vai entender em breve do que se trata.
Arrumei um colchão pra mim no chão enquanto a húngara me olhava da beira da cama. Deitei enquanto a húngara me olhava da beira da cama.
Virei pro outro lado e a húngara continuava me olhando na beira da cama.
-Algum problema?
Quase chorando, mimada dengosa (que palavra escrota, mas é a que descreve melhor) de olhos azuis dos infernos ela me responde:
- É que depois de tudo que aconteceu onde eu moro, pensei que você tinha me chamado pra gente dormir junto.
Calmamente, levanto do colchão, sento ao lado dela na cama e explico:
-Querida N., não sei dos hábitos húngaros, mas no Brasil, e no meu relacionamento atual, não é aceitável "dormir junto" (fiz as aspas com os dedinhos pra ela nessa hora) de uma mulher que não seja a sua namorada.
-Não, mas não tem problema, não precisa acontecer nada, só vamos dormir juntos... EUROPEAN STYLE.
É como chegamos ao início do fim. Início desse texto, fim do meu namoro de 2 anos. Dormimos juntos. Não, eu não fiz nada, nem um beijinho. Mas imagine, sua namorada, que está temporariamente morando na sua casa, chega as 7 horas da manhã e vê uma loira gostosa deitada com você. O que dizer á ela numa hora dessas?

-Calma, A. não é nada disso que você tá pensando! 


Caso você tenha a oportunidade maravilhosa de ser pego na cama com uma outra, acredite: tenha feito tudo ou não tenha feito nada, você não vai resistir ao cliché automático das novelas e vai dizer o que eu disse :
- Calma, (nome da sua namorada) não é nada disso que você tá pensando...


Eu falei isso e explodi numa gargalhada por estar falando o cliché mais novela das 8 possível.  A linda húngara que acordou com o lindo cabelo sendo puxado, com tapas na linda cara e ouvindo lindas palavras chulas que o português quase zero dela certamente não conhecia, não entendeu nada. Ainda mais porque eu ria e apanhava ainda mais da minha ex quando explicava que não tinha acontecido nada. Ria ainda mais e apanhava ainda mais quando falava que ela só dormiu comigo porque a casa dela tinha pegado fogo!

Depois da surra que acordou os vizinhos, meu amigo que morava comigo, acalmou e levou minha namorada pra fora do apartamento e na volta escutou a gringa dizendo:
-Você não quer que eu fale nada com sua namorada? Eu posso explicar que você não fez nada, que só foi super gentil e que só dormimos EUROPEAN STYLE...( amaldiçoada seja a Europa e seus estilos de dormir)
-Melhor não, N. você já apanhou bastante e vai apanhar mais se encontrar ela ainda hoje.
Assim, 7 e poucos da manhã, desço de short de pijama e sem camisa com a gringa até a portaria do meu prédio. Quando estou eu chegando no portão de saída do prédio acompanhando a gringa, minha namorada está voltando pro prédio: baixaria cinematográfica.
Então minha agora ex-namorada, depois de mais uma surra na gringa e em mim, dessa vez na portaria do prédio,  entra e sobe o elevador. Eu observo atônito e rio da surrealidade desta história real, baseada em fatos de cinema. A húngara sai e vai rebolando gostosona pela manhã numa rua de Laranjeiras.
O porteiro, um coroa sacana de 60 e poucos anos, observa ainda chocado, amarrotado e levemente arranhado por tentar apartar a peleia. Ele olha pra bunda rebolante da gringa, me olha e diz:
- Bom, pelo menos você comeu bem hein... haha Foda foi boa, né garoto?

Rio muito respondo:

-Antes fosse, seu Chico, antes fosse!
Depois de ter apanhado de short de pijama na portaria do meu prédio, depois de ter sido aviltado aos berros na Conde de Baependi, de ser chamado de galinha, piranhudo, filho da puta, cretino, sem ter feito NADA com a gringa... De fato, a cena que ela viu, não FOI nada do que ela estava pensando. Mas quer saber?
Antes fosse.






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